Os textos aqui publicados não retratam necessariamente a opinião da entidade, mas a de seus autores.

Getulio Lucas de Abreu

Advogado

glajuridico@italnet.com.br

A matéria de capa veiculada no Semanário na edição de 14.04.2.010, enfocando os questionamentos na Câmara de Vereadores sobre a freqüente ausência de licitações no âmbito do Poder Executivo local, é uma ótima oportunidade para que este relevante tema das licitações e contratos administrativos seja debatido com a transparência que merece. Por oportuno convém lembrar que a Constituição Federal de 1988 de modo inovador, ao menos em relação às anteriores constituições da República, dentro do Título III – Da Organização do Estado (arts. 18 a 43), abre o capítulo VII especificamente para tratar Da Administração Pública, artigos 37 a 43. Cabe observar aqui que a feição fundamental da organização do Estado brasileiro é dada pela sua estrutura federativa, da qual resultam três esferas de governo, todas dotadas de capacidade política e administrativa. É o que se pode extrair da leitura do art. 18 da CF/88, no capítulo I, que trata da ‘Organização Político-Administrativa’.

“Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição”.
Tudo isto para deixar plenamente claro que a administração pública, seja ela federal, estadual ou municipal deve obediência à Constituição e ao ordenamento legal infraconstitucional. Assim, a Lei Federal n° 8.666, de 21 de junho de 1993 regulamenta o art. 37, inciso XXI da Constituição Federal, justamente no campo das licitações e contratos administrativos. Desse modo, fazer ou deixar de fazer uma licitação quando for para adquirir bens e serviços para a administração pública NÃO é um ato de mera liberalidade do administrador. Convém não olvidar que a administração de todos os Poderes está submetida a este regramento.

Diante deste quadro, efetivamente é de nenhuma necessidade qualquer legislação municipal para compelir o administrador público local proceder licitação quando for realizar obras; adquirir serviços, inclusive de publicidade ou quando for comprar bens materiais, alienar bens do patrimônio público ou proceder à locação para o seu uso próprio. Aliás, para ser mais claro, a Câmara Municipal não tem competência para legislar sobre esta matéria, a qual está inserida entre as competências privativas da União, conforme o disposto no inciso XXVII, do art. 21 da constituição Federal que ali diz ser competência privativa da União legislar sobre “normas gerais de licitação e contratos, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas, e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no at. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, §, 1º, III”.
Não estando a matéria inserida entre as competências do Legislativo Municipal, qualquer iniciativa neste campo é matéria que realmente não pode ser apreciada pela Câmara. Contudo, não se diga que não devem os Vereadores se preocupar com o assunto. Pelo contrário, devem e muito, sob pena de não estarem cumprindo com as suas atribuições.

Vem também do ordenamento constitucional as atribuições do Poder Legislativo, sempre lembrando o artigo 2º da Constituição onde está escrito que os Poderes da União são o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, independentes e harmônicos entre si e como se sabe nem sempre tão independentes e também nem tanto harmônicos.

Então, sabem os Senhores Vereadores que a sua função básica é fiscalizar os atos da administração pública, onde se inclui inclusive os atos da administração do próprio Poder Legislativo. Cabe aqui o alerta para a inovação do art. 37 da Constituição Federal que inclui entre os princípios básicos a que a administração pública está submetida o princípio da eficiência e este princípio é para os italianos conhecido como “dever de boa administração” e que impõe à Administração Pública direta e indireta a obrigação de realizar suas atribuições com rapidez, perfeição e rendimento. Aprofundando a compreensão desta questão, cabe aqui o destaque para o ensinamento de Diógenes Gasparini, chamando atenção para a aplicação do princípio da eficiência, que bem pode ser seguido pelos Senhores Vereadores, na fiscalização dos atos da administração pública:

“As atribuições devem ser executadas com perfeição, valendo-se das técnicas e conhecimentos necessários a tornar a execução a melhor possível, evitando a sua repetição e reclamos por parte dos administrados. Ademais, a realização cuidadosa das atribuições evita desperdício de tempo e de dinheiro públicos, tão necessários na época atual. Por fim, tais competências devem ser praticadas com rendimento, Isto é, com resultados positivos para o serviço público e satisfatório para o interesse da coletividade.”

Para concluir, talvez não seja demasia lembrar o art. 41 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Européia (Nice, 2002), que proclama o “direito a uma boa administração”. Aqui entre nós o notável Professor Juarez Freitas guinda o este principio à categoria de direito fundamental. Por certo que não é evitando realizar licitações que nossos administradores estarão cumprindo com estes mandamentos!

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