Os textos aqui publicados não retratam necessariamente a opinião da entidade, mas a de seus autores.

Jeferson Dytz Marin

Advogado

jmarin271@hotmail.com

Não é íntegro evocar o conhecimento numa prova de aptidão que traduz o ápice de uma intelectualidade burra, refletida na imposição da lembrança fotográfica da lei, sem qualquer compromisso com o saber crítico e inventivo, verdadeiro esteio do desenvolvimento intelectivo do homem.

A última prova da OAB alcançou o recorde de reprovação do Estado do Rio Grande do Sul. A segunda fase ocorreu no último dia 1 de março. Na primeira fase, dos 4.922 inscritos, apenas 822 foram aprovados, redundando em 83,3% de reprovação, ao menos antes do julgamento dos recursos apresentados.

O problema agrava-se na comparação com os demais Estados que participam do exame unificado, já que o Rio Grande do Sul amarga as últimas colocações. O primeiro colocado nesta etapa do exame foi o Piauí, com índice de aprovação de 33%.

Não há dúvidas que o excesso de cursos interfere no desempenho gaúcho. Hoje, são 34 instituições. Também a insuficiência do ensino primário contribui para o desastre. Basta saber que, segundo o MEC, ao longo de 10 anos, as notas de Língua Portuguesa, disciplina essencial ao Direito, não evoluíram. Enquanto a média de 1995 era de 188,3 (de zero a 500), em 2005 fechou em 172,3.

A remuneração dos professores é outro aspecto decisivo. Enquanto na Coréia do Sul um professor aufere o equivalente a R$ 10.000,00 por mês, no Brasil, é necessário brigar no STF para a fixação de um piso inferior a R$ 1.000,00.

Ademais, das 159 mil escolas que o MEC contabilizava em 2006, apenas 27,4% contam com uma biblioteca, revelando um alarmante desprestígio aos livros, instrumentos educativos por excelência.

Por fim, a queda da qualidade dos cursos de direito coroa o sintoma patológico crescente que a prova da OAB denota. Mas o ponto nevrálgico parece habitar exatamente na natureza do teste e nas formas de aferição do conhecimento eleitas.

Definitivamente, vivemos na era da velocidade e da técnica. Bauman denominou modernidade líquida, face à fluidez da informação. Heidegger, por sua vez, concebeu há muito a fase que o homem alcançaria no século XXI.

A principal razão da sensação de tempo acelerado se dá em face da mudança do conceito de espaço. Ou seja, a comunicação on line afastou a necessidade de se percorrer longas distâncias e trouxe a informação em tempo real.

A prova da OAB, os concursos públicos e os processos seletivos em geral seguem essa lógica estereotipada.

Os certames objetivos cobram um conhecimento calcado na memorização, na presença estática dos artigos de lei, das súmulas dos tribunais e da jurisprudência sintomática.

Não há que se negar a clarividência do estudo jurisprudencial, sem embargo, parece inarredável a ilação de que a capacidade intelectiva exigida pelo exame de aptidão da OAB é robótica, matematizada, voltada às certezas absolutas de Platão. Norte assaz distante do conhecimento verossímel, arrimado na argumentação, que o Direito Moderno reclama.

De fato, faz-se necessário um teste rigoroso aos profissionais de todas as áreas, com o escopo de assegurar a qualidade do mercado, reduzindo os riscos da contratação pelos tomadores dos serviços.

Todavia, a OAB deve alimentar-se do incentivo à dúvida que o coelho provocava em Alice no País das Maravilhas e não na sua velocidade e afã reprodutivo, amantes da informação instantânea, mas desqualificada e sem caráter instigativo.

Claro que o estudante eterno do direito deve aprender a apartar-se do mundo das apetitosas futilidades do cotidiano. Organizar o tempo e selecionar as informações na imensa teia que nos envolve é o primeiro passo para a busca do conhecimento qualificado.

Todavia, enquanto agirmos como coelhos, calcificados pela azáfama dos dias, mergulhados nas demandas crescentes, seremos zumbis, embalsamados num casulo profissional que inuma a individualidade e despersonaliza as relações.

É evidente a existência de informação em abundância, contudo, o crescimento da letargia seletiva blinda o pretenso caráter utilitário da evolução comunicativa.

Os textos aqui publicados não retratam necessariamente a opinião da entidade, mas a de seus autores.

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